Uma auditoria realizada pela Controladoria Geral da União, no ano de 2021, no Hospital Napoleão Laureano, em João Pessoa, registrou que a unidade tem o maior percentual de mortes de pacientes oncológicos do Nordeste,
A fiscalizaçõ foi feita depois de pedido do Ministério Público Federal, que abriu inquérito para investigar denúncias de problemas na unidade. A divulgação do relatório foi feita no último dia 30 de janeiro.
A CGU fez uma análise comparativa da quantidade de óbitos de pacientes em tratamento, em 2021, por meio de uma amostra de dez hospitais de referência no tratamento oncológico da Região Nordeste, incluindo o Hospital Napoleão Laureano (HNL). O resultado chamou atenção.
Do total de 2.559 pacientes que foram internados no HNL, em 2021, observou-se que 521 pacientes foram a óbito durante o período de internação, correspondendo a um percentual de 20,36%.
Destaca-se que o percentual de óbitos em internações do HNL corresponde ao maior valor dentre os hospitais da amostra e representa, aproximadamente, duas vezes o valor percentual médio de óbitos de 10,19% da amostra.
Segundo a CGU, em reunião representantes do HNL, órgão foi informado que pacientes oncológicos terminais, em situação de cuidados paliativos, são frequentemente transferidos para o Hospital Padre Zé, em João Pessoa/PB.
Com a transferência do paciente, a internação e o possível registro de óbito no sistema do SIH/SUS é realizado para o Hospital Padre Zé, e não mais para o Hospital Laureano. Dessa forma, há um indicativo de que o percentual de óbitos de pacientes internados no HNL seja ainda maior, caso não houvesse transferências de pacientes em estágio terminal do HNL para outro hospital”, frisou o relatório.
Em nota enviada ao Conversa Política, a direção do Hospital Napoleão Laureano afirmou que a taxa de mortalidade, “está de acordo com a média para instituições da natureza do Laureano, assim como considerando as peculiaridades locais” (confira nota da Direção do Laureano, na íntegra, abaixo).
Segundo cenário
Os auditores fizeram um recorte com uma amostragem diferente e as porcentagem de mortalidade também foi bem maior que a média. Nessa segunda análise foram considerados os pacientes internados, em 2021, restritos àqueles pacientes que possuem o Cartão Nacional de Saúde (CNS) informado no sistema SIH/SUS com o CPF inserido no
Cadastro Nacional de Usuários do Sistema Único de Saúde (CADSUS).
“A partir do CPF dos pacientes dessa amostra, foi realizado um cruzamento com dados do Sistema Nacional de
Informações de Registro Civil / Documentação (SIRC/DO) e com a base de dados de Pessoa Física da Receita Federal (RFB), com o objetivo de verificar se ocorreram óbitos durante ou após o período de internação, em 2021 ou 2022”, explicou.
Nesse caso, do total de 2.351 pacientes que estiveram internados, em 2021, no HNL, verificou-se que 950 pacientes foram a óbito durante ou após o período de internação, correspondendo a um percentual de 40,41%, quase o dobro do percentual médio de 23,02% de toda a amostra. Confira resumo na tabela.
Outros problemas
No relatório de auditoria, a CGU identificou falhas graves e irregularidades nos atendimentos que, segundo os técnicos, comprometem a prestação dos serviços bancados com dinheiro público, na unidade filantrópica. Entre as irregularidades, segundo relatório, um aparente esquema de “fura-fila”.
Isso porque pacientes iniciaram seus tratamentos oncológicos sem autorização da Central de Regulação da SMS/JP (Secretaria de Saúde de João Pessoa), realizando pagamentos diretamente ao Hospital, e constituindo indício de que o acesso igualitário e gratuito não é garantido pelo Hospital.
A Fundação Napoleão Laureano é a instituição contratualizada pela Prefeitura Municipal de João Pessoa/PB para a prestação de serviços médico-hospitalares e ambulatoriais de alta e média complexidade em oncologia, no âmbito
do SUS, para todo o estado da Paraíba.
O que disse a direção do Hospital Napoleão Laureano?
A direção do Hospital Napoleão Laureano afirmou que a taxa de mortalidade, “está de acordo com a média para instituições da natureza do Laureano, assim como considerando as peculiaridades locais”. Confira nota da Direção do Laureano, na íntegra, abaixo.
Sobre as falhas nos procedimentos, a direção da unidade destacou que eventuais erros e/ou falhas cometidas, quer na confecção de documentos, inserção de dados nos sistemas etc., são fatos, infelizmente, inerentes ao ser humano.
Como todos os atos são realizados por seres humanos, não havendo qualquer indicação de má-fé ou intenção de lesar o erário, não pode ser questionada a importância que o Laureano representa para o Estado”, trouxe a nota.
Apoio
O Hospital conclui a nota afirmando que o que se deve buscar, neste momento, é auxílio das autoridades e da população civil em favor do Hospital Napoleão Laureano, das demais instituições de saúde do Estado e, principalmente, da população carente que necessita daquelas entidades para terem seus atendimentos garantidos.
“Se todos não tiverem juntos em prol do mesmo fim, este cenário não irá melhorar. Pelo contrário, a probabilidade é piorar”, concluiu.
NOTA DE ESCLARECIMENTO
Por ser o Hospital Napoleão Laureano o único Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia – CACON, com serviço de pediatria, responsável pelo atendimento de mais de 70% dos casos de câncer de usuários SUS do Estado, ele é submetido a análises e auditorias periódicas de todos os órgãos públicos competentes, incluindo o Ministério da Saúde, DENASUS, Prefeitura de João Pessoa, Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Tribunal de Contas da União e Controladoria Geral da União.
E estas fiscalizações são necessárias não apenas para garantir o regular funcionamento da entidade, mas, principalmente, para que os órgãos públicos tenham ciência das limitações do SUS e, assim, possam buscar a adoção das medidas necessárias para assegurar o atendimento à população carente.
Inclusive, nesta linha, o DENASUS e o Tribunal de Contas da União já emitiram Relatórios recentes reconhecendo a defasagem da Tabela do SUS (sem reajuste há mais de 13 anos), bem como a prática de glosas (serviços prestados, mas não pagos pelo SUS) envolvendo o Laureano e demais hospitais do Estado e, também, os atrasos nos repasses dos recursos financeiros destinados às entidades.
Nesse cenário, recentemente, a Controladoria Geral da União, após auditoria feita no Laureano, emitiu Relatório fazendo questionamentos acerca de algumas formas de atendimentos realizadas pelo Hospital.
Segundo a CGU, pacientes usuários do SUS oriundos de outros Municípios (fora de João Pessoa) não poderiam ser atendidos diretamente pelo Hospital Napoleão Laureano, sem intermédio da Regulação da Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa (SMS/JP), ainda que haja contratação por parte do respectivo Município de origem. Diz a CGU que, como o Laureano mantém um Convênio com o Município de João Pessoa, que é o responsável pela regulação dos atendimentos realizados no Estado da Paraíba, não poderia o Laureano atender diretamente pacientes de outros Municípios sem o “aval” da SMS/JP.
Porém, de acordo com nossa Constituição Federal, a responsabilidade do financiamento do sistema Único de Saúde (SUS) é tripartite, ou seja, das três esferas de governo: federal, estadual e municipal, por meio da vinculação de orçamento da seguridade social, cabendo aos municípios o dever de investir no mínimo 15% de suas receitas.
Além disso, infelizmente, alguns serviços não são cobertos no Convênio firmado entre a SMS/JP e o Hospital, sem falar no fato de que, em muitos casos, o quantitativo de vagas destinadas a pacientes do interior é bastante limitado, restringindo, assim, o atendimento de parte destes pacientes via Regulação de João Pessoa.
A Programação Pactuada e Integrada (PPI) possui um limite anual e muitos pacientes não conseguem regulação exatamente por esse número limitante que não expõe a realidade de cada município.
Como a PPI é insuficiente para tratamento dos pacientes oncológicos no Estado da Paraíba, resta aos Municípios, por obrigação legal e constitucional, adotar as medidas necessárias para garantir o direito a saúde a seus munícipes, contratando, assim, determinados serviços diretamente com o estabelecimento de saúde (não apenas é o caso do Laureano).
E, em muitos casos, caso não tivessem sido executados os serviços contratados, alguns destes pacientes poderiam sucumbir na fila e não ser tratados no momento oportuno.
Além disso, o HNL apresenta plena capacidade de executar, sem prejuízos para outros pacientes. Logo, a prestação dos serviços questionados não afetou, em nada, o atendimento regular aos usuários do SUS em consonância com o Convênio firmado com o Município de João Pessoa.
Além disso, não há nenhuma espécie de “fura fila”. Todos os pacientes inseridos na relação de atendimento do Laureano através da Regulação de João Pessoa são atendidos regularmente. O atendimento de pacientes de outros municípios, mediante regulação direta do município de origem, não afeta em nada o atendimento daqueles.
Mesmo assim, deve o Laureano negar o atendimento de usuários do SUS originados de outros Municípios? Se o Laureano deixar de atender tais pacientes, eles serão atendidos por quem? A deficiência financeira do SUS deve negar o direito destes pacientes receberem o atendimento devido mesmo dispondo o respectivo Município de origem da fonte de recurso destinada para este fim?
Quanto ao questionamento feito pela CGU consiste no fato de que alguns pacientes terem sido inicialmente atendidos de forma particular e, posteriormente, passados a serem atendidos através do SUS, tal conduta também não representa irregularidade, até porque o Laureano é uma entidade privada que atua condição de participante complementar SUS, podendo, assim, ofertar parte de sua capacidade a particulares e convênios privados de saúde.
Logo, o atendimento de pacientes particulares (ou seja, que custearam diretamente os serviços ofertados pelo HNL) é prática totalmente legal.
Inclusive, como não distribui lucros, a totalidade dos recursos recebidos por procedimentos pagos por particulares é aplicada no hospital para minimizar o gigantesco déficit da tabela SUS e, assim, poder garantir a continuidade do fornecimento de serviços aos usuários do referido sistema.
E, mesmo tendo realizado algum procedimento particular, caso o paciente queira passar, em seguida, a ser atendido pelo Sistema Único de Saúde, como este é UNIVERSAL, não pode o HNL negar tal direito, devendo, como faz, encaminhar, assim, o paciente para a respectiva regulação pela Secretaria Municipal de Saúde.
E isso, porém, repita-se, não afeta, de forma alguma, a fila da regulação, posto que todos os procedimentos realizados via SUS são submetidos e seguem os fluxos previstos na Central de Regulação.
É importante destacar aqui, também, que, em todos os casos apontados, como reconhecido pela própria CGU, não houve qualquer cobrança em duplicidade. Ou seja, ou o serviço foi custeado de forma particular ou o serviço foi custeado pelo SUS, de modo que não há que se falar em qualquer prejuízo e/ou dano à Administração Pública.
Quanto à taxa de mortalidade mencionada pela CGU, esta está de acordo com a média para instituições da natureza do Laureano, assim como considerando as peculiaridades locais.
Importante destacar, ainda, que eventuais erros e/ou falhas cometidas pelo Hospital Napoleão Laureano, quer na confecção de documentos, inserção de dados nos sistemas etc., são fatos, infelizmente, inerentes ao ser humano. Como todos os atos são realizados por seres humanos, não havendo qualquer indicação de má-fé ou intenção de lesar o erário, não pode ser questionada a importância que o Laureano representa para o Estado.
E, havendo qualquer equívoco, o Hospital, como sempre, busca implementar melhorias para que estes erros não se repitam, além de se manter sempre disposto a reparar qualquer eventual situação havida.
Independentemente disto, o que se deve buscar neste momento é auxílio das autoridades e da população civil em favor do Hospital Napoleão Laureano, das demais instituições de saúde do Estado e, principalmente, da população carente que necessita daquelas entidades para terem seus atendimentos garantidos. Se todos não tiverem juntos em prol do mesmo fim, este cenário não irá melhorar. Pelo contrário, a probabilidade é piorar.
Fonte: Jornal da Paraíba